Corpo de Capelães Voluntários

 

Num contexto político muito desfavorável à Igreja Católica Romana, o Cardeal Patriarca António Mendes Belo em representação do Episcopado Português, em Julho de 1916 esforçou-se para conseguir fazer chegar à presidência da república um pedido para incorporar capelães junto das unidades que se encontravam em preparação para partirem para França. Porém, só a 30 de Novembro de 1916 foi finalmente assinado, por Bernandino Machado e Norton de Matos, o Decreto 2869 que deu permissão aos comandantes das forças militares em operações de guerra para incorporarem ministros portugueses das diversas religiões.

Apenas a 18 de Janeiro de 1917, poucos dias antes de se iniciar o grosso do transporte do contingente para França, foi concretizada a regulamentação de assistência religiosa em operações de guerra com a publicação do Decreto 2942, pelos mesmos signatários.

A falta de capelães no Corpo Expedicionário Português (CEP) mereceu alguns reparos e críticas por parte dos britânicos, o que poderá ter sido uma das razões que levou o Ministro da Guerra Norton de Matos a decidir, em  Março de 1917, aceitar um número elevado de capelães voluntários. Mas o ambiente político e a vontade republicana na causa da separação da Igreja e do Estado, levou a que os capelães voluntários fossem todos equiparados a alferes.

Para a Igreja, através da Comissão Central de Assistência Religiosa em Campanha (CCARC), era evidente que deveria existir um capelão que superintendesse a missão espiritual em França, tendo sido escolhido entre os voluntários o Cónego da Sé da Guarda, José do Patrocínio Dias, para chefiar a missão. (na foto ao centro sentado)

O número de capelães no teatro de guerra demonstrou ser proporcionalmente diminuto, comparando com os efectivos de assistência religiosa no exército britânico, ideia também partilhada pela CCARC. A contenção de efectivos na assistência religiosa portuguesa foi em parte devido à grande desconfiança que os políticos republicanos tinham sobre o trabalho efectuado pelos capelães, ao ponto de ter sido emitida a seguinte ordem aos Serviços Postais de Campanha (SPC):


"Ordem Serviço SPM, nº 49, de 27 de Agosto de 1917,

Por ordem de Sua Ex.ª o General [Tamagnini de Abreu], em virtude do determinado por sua Ex.ª o Ministro da Guerra [Norton de Matos], as forças que fazem parte do CEP não podem receber os seguintes livros: O livro do Soldado Português, pelo Padre José Lourenço de Mattos; O Manual do Soldado Português, adoptado pela Comissão Central de Assistência Religiosa em Campanha. Porque o primeiro contém doutrina contra as Instituições vigentes e à Constituição Política da República e o segundo porque o seu título quase indica que todos os soldados portugueses são católicos o que não é verdade. V.Ex.ª aprenderá e remeterá a esta secretaria [Quartel-general do CEP] todos os exemplares que aí dêem entrada." (FPC/EHS/CX1, Arquivo CEP - Serviço Postal de Campanha)


A Comissão Central de Assistência Religiosa em Campanha tinha conhecimento de outros padres que se encontravam em França inseridos no contingente do CEP, razão pela qual exerceu pressão junto do Ministro da Guerra para que esses homens fossem colocados no Corpo de Capelães Voluntários, evocando falta de capelães nas Brigadas e ambulâncias da primeira linha. Conseguiu em Janeiro de 1918, quando Sidónio Pais acumulava o Ministério da Guerra, que o General Tamagnini de Abreu admitisse um aumento de efectivo de capelães voluntários, o qual foi autorizado em 16 de Maio de 1918, com a publicação do Ofício n.º 141.

Em Junho de 1918, foi publicado o Decreto 4489, de 4 de Junho de 1918, que integrou no Exército os capelães voluntários com os vencimentos correspondentes ao posto de alferes e que abriu o âmbito da assistência religiosa aos hospitais, navios, asilos ou qualquer estabelecimento onde existissem doentes, feridos, mutilados ou repatriados de guerra. Este Decreto concretizou as pretensões da CCARC ao permitir ao comandante do CEP, sob proposta dos comandantes das unidades, autorizar a transferência para o serviço de assistência religiosa dos oficiais e praças necessários. O Corpo de Capelães Voluntários chegou a ter um efectivo máximo de 36 padres.

Por último, não se poderá deixar de relevar o trabalho desses voluntários, que nas suas missões de assistência religiosa e humanitária demonstraram estarem à altura das exigências colocadas, como ficou reconhecido em muitas Ordens de Serviço e louvores que o Exército redigiu. Se os políticos republicanos duvidavam do patriotismo dos capelães, ficou provado o seu amor à Pátria ao obrigarem que os cadáveres dos militares portugueses fossem cobertos com a Bandeira Nacional em vez da bandeira britânica, como acontecia até então. A importância deste facto foi relembrado na obra “A Grande Aventura”, de António Granjo, onde este afirma que o Estado não soube compreender o trabalho e o sacrifício que os capelães viveram no "front".

Carlos Alves Lopes (IHC)

Fotografia - Legenda completa:

De pé: Padre António Rebelo dos Anjos; Padre Jacinto de Almeida Mota; Padre Luís Lopes de Melo; Padre Ângelo Pereira Ramalheira, Cónego Álvaro Augusto dos Santos; Padre António Tavares de Pina.
Sentados: Padre José Manuel de Sousa (Pároco de Gemeses em Esposende), Cónego José do Patrocínio Dias, Padre Avelino Simões de Figueiredo.

Data: 06/02/1918
Fotógrafo: Desconhecido, em Merville (França)
Arquivo: Carlos Alves Lopes

 

Cite como: Carlos Alves Lopes, "Corpo de Capelães Voluntários", A Guerra de 1914 - 1918, www.portugal1914.org

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