O iate Gomizianes da Graça Odemira

 
Legenda: Um iate em Vila Nova de Milfontes. Presume-se que é o Gomizianes ou o Estrela de Odemira. Cedência da fotografia cortesia de António Martins Quaresma.

 

Após a entrada de Portugal na Primeira Grande Guerra em Março de 1916, a frota mercante nacional tornou-se uma presa legal para o inimigo. De grandes cargueiros a vapor até pequenas embarcações de pesca, cerca de uma centena de navios arvorando o pavilhão português perderam-se devido à acção dos submarinos imperiais alemães.

A 13 de Setembro de 1917, à vista do cabo de Sines, o submarino imperial alemão UB50, comandado pelo Kapitanleutant Franz Becker ataca e afunda dois veleiros portugueses. São eles os iates Gomizianes da Graça Odemira e Correio de Sines, ambos registados no porto de Lisboa.

Carregado em Odemira com 660 sacos de trigo, 250 sacos de milho e algumas toneladas de pranchas de cortiça, o iate Gomizianes da Graça Odemira desceu o rio Mira até ao porto de Vila Nova de Milfontes, de onde zarpou para Lisboa no dia 13 de Setembro. Navegava junto à costa, tentando dissimular-se, mas tal não bastou para que não fosse detido com uma salva de aviso que lhe passou entre os mastros.

Avistado pelo submarino imperial alemão UB50, o iate deteve a sua navegação e a tripulação foi intimada a abandoná-lo num pequeno bote. Vendo o seu iate prestes a ser afundado, o mestre José Brissos desespera e tenta lançar-se ao mar para se perder juntamente com o seu «ganha-pão». Não tinha qualquer tipo de seguro, nem da embarcação, nem da carga, e a perspectiva de tudo perder levou-o a implorar que o deixassem afundar-se com o Gomizianes. O comandante do UB50, que os marinheiros portugueses descreveram como “um tipo gordo e rosado”, ordena a José Brissos que suba a bordo do submarino, onde o informou que seria indemnizado dos prejuízos e que para isso lhe daria um documento, documento este que não foi mais do que o seu nome e a identificação do submarino, rabiscados numa folha arrancada a um livro.

Cerca de 45 minutos depois do tiro de aviso, o iate Gomizianes da Graça Odemira foi afundado com uma carga explosiva de grande potência, sendo projectados a grande altura pedaços do navio e pranchas de cortiça da sua carga.

Toda a tripulação saiu ilesa deste episódio, mesmo o mestre José Brissos, demovido dos seus intentos suicidas.

O UB50 saiu a navegar para Sul vindo a fazer outra vítima, desta feita o iate Correio de Sines.

 

O jornal "A Capital", narrando o afundamento

Legenda: O jornal "A Capital", narrando o afundamento.


Na área em que o iate Gomizianes da Graça Odemira se afundou, poucas milhas náuticas a Norte do cabo de Sines, foi recentemente localizado um destroço de madeira, cujo estado do madeirame do costado indicia ruptura catastrófica da sua estrutura. Não só a área onde se encontra o destroço corresponde à localização mencionada nas fontes, como a ausência de evidência de motorização leva a supor estar-se perante o destroço de um navio à vela. O destroço foi entretanto observado por um arqueólogo subaquático do Instituto de História Contemporânea / Instituto de Arqueologia e Paleociências da Universidade Nova de Lisboa, e constitui hipótese de trabalho para ser estudado como provável vestígio do iate Gomizianes da Graça Odemira, investigação esta que decorrerá ao longo de 2016.

Pretende-se assim contribuir para a localização, identificação e estudo do Património Cultural Subaquático em contexto de Primeira Grande Guerra em águas portuguesas.

 

Cavilha em liga cúprica, de secção octogonal. Fotografia de Joaquim Parrinha.

Legenda: Cavilha em liga cúprica, de secção octogonal. Fotografia de Joaquim Parrinha.

 

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Legenda: Madeirame de reduzida expressão, provavelmente escoas. Fotografia de Joaquim Parrinha.

 

Cite como: Paulo Costa, "O iate Gomizianes da Graça Odemira", A Guerra de 1914 - 1918, www.portugal1914.org

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